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Hans Neuner na renovada sala de jantar do OCEAN
Com a completa remodelação do OCEAN, este é claramente um ano marcante para Hans Neuner – haverá sempre um antes e um depois de 2016.
Mas a mudança não se dá apenas na sala e na cozinha – dá-se também no que é cozinhado!
Com efeito, ultrapassada a fase inicial da cozinha de Hans Neuner no OCEAN – aquela fase de fine dining internacional feito com alguns produtos locais mas que podia ser servido no Algarve ou em qualquer outra parte do mundo – o chef austríaco começou a recuperar e a interpretar à sua maneira o receituário tradicional algarvio e os seus sabores, bem como as raízes e influências árabes na cozinha do Algarve, uma vez que conhecia bem a cozinha marroquina.
Contudo, há agora o acentuar de uma nova inflexão.
Uma terceira fase.
Ou seja, depois de a “cozinha internacional com produtos algarvios” (1.ª fase) ter evoluído para uma “cozinha algarvia by Hans Neuner” (2.ª fase) agora estamos cada vez mais numa “cozinha by Hans Neuner com produtos algarvios” (3.ª fase).
Isto é, a cozinha de Hans Neuner está menos algarvia!
Estando cada vez mais personalizada e única – parece não vir de lado nenhum senão dele próprio!
Sendo esta – curiosamente ou talvez não – uma alteração que reforça substancialmente a candidatura do OCEAN à terceira estrela Michelin no mini campeonato que tem estado a disputar com o VILA JOYA de Dieter Koschina e o BELCANTO de José Avillez.
E por duas ordens de razões.
Primeiro, elimina o inconveniente de os inspetores não serem portugueses e consequentemente não terem suficiente cultura gastronómica para apreciarem e entenderem devidamente as nuances e as subtilezas de quem está a modernizar a cozinha tradicional portuguesa.
E depois porque na atribuição da terceira estrela – a distinção máxima – o guia não tem apenas em conta o restaurante mas também o chef. Ora, quanto mais original, personalizado e consistente for o seu trabalho, maior a probabilidade de vir a ser distinguido.
Concretizando com um exemplo, aqui fica a recordação de um jantar de junho de 2016:
A abrir, um complexo jogo de aromas, sabores, texturas e temperaturas: carabineiro da costa algarvia, toucinho, ervilhas biológicas, neve de flor de sabugueiro e um molho morno de basílico servido na mesa!
No segundo snack, uma ostra da Ria Formosa, ananás dos Açores, fígado de ganso, mini merengues de malva-rosa e, já na mesa, uma essência morna de água de ostras!
Tão bonito quanto saboroso, como todos os snacks de Hans Neuner: barriga de atum do Algarve, endro e variações de pepino em que sobressaem as agradáveis notas avinagradas do vinagre de arroz, tendo por cima gaiado seco, um atum pequeno que se pesca na ilha da Madeira
Mais um exemplo de que Hans Neuner está a autonomizar-se do receituário algarvio. Ao quarto snack, surge então a primeira referência expressa a um prato do Algarve – a cataplana – mas apenas como molho de uma especialidade andaluza: “Calamares/Cataplana/Morcela”. Muito bom, foi servido a dois tempos: primeiro, um lollipop estaladiço feito com batata, paprika e polvo; e depois, no prato, aioli de açafrão, batata e, ainda, lulas bebés recheadas com morcela, acompanhadas do tal apurado molho de cataplana com um sabor intenso a coentros!
O fim dos snacks – ou dos “Amores de Boca”, como lhes chama o chef austríaco, evitando a expressão “Amuse-Bouche” – trouxe o melhor momento de todos eles: uma lapa, trabalhada por Hans Neuner com sumo de limão, molho de peixe, chalotas e coentros do Algarve… servida numa concha feita de manteiga de cacau e lagostim! Para comer tudo à mão... e de uma só vez! Fabuloso!
Depois da finger food, há que refrescar os dedos!
Numa caixa de joias, o pão multicereais com 70% de cevada, feito no OCEAN pelo chef pasteleiro Márcio Baltazar a partir de uma receita alemã… e as manteigas, “pérolas da cozinha” elaboradas a partir de leite de cabra
Passando à entrada do menu, uma complexa composição em que se destacavam os sabores: do lagostim da Islândia com couve kale por cima; da falsa tagliatelle, feita de choco e nabo; do creme de bergamota; do ponzu; do kimchi; das esferas fritas de carabineiro; e do molho de maçã verde!
Para prato de peixe, apenas três sabores: um filete de raia; tupinambo, também chamado de Alcachofra de Jerusalém; e salsa, muita salsa, incluindo umas gostas de óleo de salsa servidas já na mesa para intensificar o sabor!
Já o prato de carne foi o excelente pombo imperial com variações de beterraba – incluindo um cannellone recheado com foie gras, servido à parte num tronco de carvalho – em que, para além do intenso jus, também se destacavam os sabores e texturas da couve e do muesli!
As sobremesas nunca foram propriamente uma prioridade para Hans Neuner, que desde o início as aborda de uma forma bastante despreocupada. Ora, essa linha de continuidade mantém-se no menu de 2016, com uma pré-sobremesa de manga, pimentos e baunilha…
… e numa sobremesa de variações de chocolate – mousse, brownie, crumble – com gelado de cereja e polpa fresca de cacau no topo
A seguir, duas guloseimas: uma, com chocolate branco, amêndoa do Algarve e especiarias marroquinas, trazendo à memória os pratos especiados que Hans Neuner teve em tempos no OCEAN; e outra, mais doce, de caramelo e dulce de leche
Depois, numa caixa de madeira de sobreiro, trufas feitas com chocolate negro e laranja algarvia fermentada
Finalmente, com o café, para além do lollipop de açúcar que não chegou a ser utilizado, um churro recheado com creme de pastel de nata, um mil-folhas em forma de bolacha e ainda dois grãos de chocolate de café!
Chegou a hora da partida!
Fotografias: Raul Lufinha e Marta Felino
OCEAN | Vila Vita Parc Resort & Spa, Rua Anneliese Pohl, Alporchinhos, Portugal | Chef Hans Neuner
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