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Dias felizes antes da pandemia – Louis Anjos e Nuno Diogo, março 2020
O BON BON vai reabrir já este sábado, dia 23 de maio.
E ao ar livre, com o terraço a funcionar!
Numa fase inicial, regressam os almoços – que, como habitualmente, acontecem ao sábado, domingo e segunda-feira.
E depois, partir de 25 junho, serão retomados igualmente os jantares.
Porém, na primeira semana de março – então ainda à volta da lareira e longe de se saber que daí a duas semanas chegaria uma pandemia que mudaria o mundo – viviam-se dias felizes no BON BON.
A habitual pausa de inverno, durante os meses de dezembro e janeiro, tinha sido bastante revigorante.
E a temporada de 2020 – do agora único restaurante de rua estrelado do Algarve (os restantes fazem parte de hotéis e resorts) – prometia.
Tinha sido o melhor fevereiro de sempre.
E Louis Anjos, cada vez mais solto no seu terceiro ano de BON BON, acabara de mudar todo o menu.
Ao qual deu somente o singelo nome de “Mar e Terra”.
Cenoura / Azeitona | Os primeiros aperitivos. Evocativos dos petiscos com que tradicionalmente somos recebidos nas mesas algarvias. Sendo ambos para comer à mão e de uma só vez! Porém, num jogo de ilusões, não é uma rodela de cenoura… nem é uma azeitona! O que parece ser uma rodela de cenoura é, na verdade, um puré de cenoura com uma capa de cenoura… e sabe às tradicionais cenouras à algarvia – frescas e avinagradas, mas também com o sabor quente dos cominhos! Já o que parece ser uma azeitona, e que o ano passado na realidade era uma mousse de sardinha assada, este ano é uma saborosa… brandade de bacalhau! De facto, nos seus menus – ainda que escondido – Louis Anjos continua a ter sempre um apontamento de bacalhau!
Choco | Num imponente choco de loiça – de enorme impacto visual – o choco trabalhado de quatro diferentes formas! 1) Todo o sabor dos chocos à algarvia com ferrado, i.e., com tinta, num denso e apurado creme muito escuro, praticamente preto. 2) “Talharim” de choco cru, finíssimo e untuoso, a desfazer-se na boca. 3) Molho de coral de choco, alaranjado. 4) Tentáculo frito. Excelente!
Milho | Numa original espiga de milho de loiça, mais dois surpreendentes aperitivos, ambos para comer à mão e de uma só vez. 1) Uma falsa maçaroca, que na verdade era uma intensa mousse de fígado de frango do campo com milho – e que sabia mesmo a iscas! 2) Ao lado, uma “surpresa”, que intencionalmente não foi descodificada, de modo a que descobríssemos o que seria: e que era, na realidade, uma deliciosa mousse de frango frita – crocante por fora, a lembrar a tempura, e líquida (!) no interior – que nos trouxe à memória o sabor… do fricassé de frango!
Pão / Azeite / Manteigas | Bom pão, feito no BON BON a partir de trigo das Farinhas Paulino Horta e com massa-mãe. / O novo azeite BON BON, da variedade Maçanilha, elegante e equilibrado, com ligeiras notas de erva fresca acabada de cortar, produzido no sotavento algarvio, em Moncarapacho, pela premiada Monterosa – curiosamente, um produtor que, ainda em vida de Detlev von Rosen, visitámos pela primeira vez com o próprio Louis Anjos em 2014, no âmbito do seu “O Algarve não é só praia…”, projeto de divulgação e valorização dos produtos locais algarvios! / Por fim, numa loiça que (continuando a marcar a diferença) reproduz uma fatia de pão barrada com manteiga (!), encontramos duas nozes de manteiga – com a forma de meia noz (!) – uma de queijo de cabra, outra de chouriço.
Soalheiro Espumante Bruto Nature 2016 | As boas-vindas foram dadas com este diferente e complexo espumante bruto natural, produzido pelo método ancestral, com pérolas de leveduras, e que tem como vinho base o Soalheiro Nature “Pur Terroir”, um Alvarinho sem adição de sulfitos. Versátil e de perfil gastronómico, também acompanhou muito bem os aperitivos!
Santola – Creme de Santola / Salada de Funcho / Gamba da Costa | A sopa de santola de Louis Anjos! Morna! Riquíssima! Feita com santolas que, contou Louis Anjos, estavam no auge, ovadas e cheias de sabor! E com gambas da costa! Bem como com o perfume e a crocância do funcho, marinado em citrinos! Mais coentros, em gel. Ervas finas. Um inesperado falso caranguejo, feito de massa e preparado com a água de cozedura das santolas, que vem reforçar a textura e a crocância de todo o conjunto! E ainda o toque do açafrão! Uma grande novidade de Louis Anjos! E que, no início da temporada de 2020, era aquele clássico momento do menu em que o chef do BON BON vem à sala! Veremos se, com a pandemia, tal ainda poderá continuar a acontecer. Mas esperemos que sim, esperemos que Louis Anjos possa continuar a ir à sala. Por exemplo, no AMADOR, 3*** austríaco de Viena que reabriu na semana passada, a 15 de maio, o chef Juan Amador está a continuar a ir à sala, agora de máscara, para finalizar os pratos na mesa do cliente!
O caranguejo… do creme de santola | Entretanto, na cozinha, Louis Anjos mostrou-nos o falso caranguejo... do creme de santola!
Lavagante – Lavagante / Couve-flor / Manga / Caviar Imperial | O novo lavagante azul de Louis Anjos! Lavagante azul que, para além do lombo, está também presente num “carpaccio” e, ainda, numa apurada e cremosa bisque! Um prato completamente diferente do anterior, que já se tinha tornado um clássico! E um prato também que, embora Louis Anjos não o tenha dito, parece ter sido criado pelo chef seguindo de perto o modo como tinha construído o anterior! Agora é “carpaccio”, antes era um tártaro... Agora é couve-flor, antes era beterraba… Agora é a manga, antes era tangerina... Agora é relish, antes era gel… Agora é bisque, antes era consommé… Sentindo-se, pois, claramente que são ambos pratos do mesmo cozinheiro! Sentindo-se identidade! E sentindo-se igualmente evolução! Excelente!
Berbigão – Xerém de Berbigão / Coentros | O reencontro com o Xerém de Berbigão de Louis Anjos! O Xerém de Berbigão do nosso primeiro menu de degustação de Louis Anjos, então no Suites Alba, em 2014! O qual fazia parte de um prato chamado “Salmonete / Xerém de Berbigão / Coentros”, que foi o momento mais marcante desse almoço! Ou, como escrevemos na altura, “o momento mais inebriante do [então] Menu Algarve”! E, de facto, desde esses tempos do Suites Alba que o Xerém é um clássico que acompanha Louis Anjos – mas, curiosamente, ainda não o tínhamos provado aqui no BON BON…! Ora, nesta noite, o Xerém de Berbigão estava extraordinário! Sem dúvida, um dos momentos mais marcantes deste jantar e deste novo menu! Estava bem quente! Com os saborosos berbigões extremamente suculentos e explosivos! Com um ar de Bulhão Pato! E com a alga codium! Apresentando um poderosíssimo sabor a mar! E também a coentros! Sendo este prato também um excelente exemplo da evolução, do crescimento, da maturidade, da consolidação da cozinha de Louis Anjos – antes o Xerém de Berbigão era somente um acompanhamento, era apenas uma parte de um prato que também tinha salmonete e milhos; agora, vale por si só! Menos é claramente mais! Valendo muito a pena o caminho de depuração que Louis Anjos continua a trilhar! E esta loiça – uma concha de berbigão – também ajuda a que o minimalismo brilhe! Excelente!
Robalo – Robalo da Costa / Cebola / Pimento / Tomate / Molho de Assado | “É como se fosse robalo assado, com cebola!”, explica Louis Anjos. Mas para muito melhor, acrescentamos nós! Esta é, de facto, mais uma daquelas situações em que o “fine dining” melhora imenso os pratos tradicionais e os pratos que são essencialmente de produto. Neste caso, peixe assado. De facto, o saboroso robalo estava maravilhoso – denso, suculento, a lascar, perfeito! A cebola, profundíssima – num pickle e, em especial, num extremamente apurado puré, pois, contou Louis Anjos, a cebola é cozinhada lentamente durante um dia inteiro. Existindo também um puré de tomate e de pimento, ambos assados em conjunto, em que predomina o sabor do tomate e que estava igualmente delicioso. Memorável, também, o denso e profundo molho do assado, feito com as cabeças e as espinhas. Tendo ainda, no topo, um crocante de alga. Sim, não deixa de ser peixe assado! Mas em bom, em muito bom! Um prato absolutamente obrigatório para apreciadores de peixe assado!
Soalheiro Alvarinho branco 2016 | Um clássico. Já com alguma evolução. Delicioso.
Borrego – Lombo de Borrego do Alentejo / Miúdos / Beringela | O borrego em dois registos. O lombo, saborosíssimo. E depois uma deliciosa esfera crocante de avelã, cujo interior tem fígado de borrego e também, para dar untuosidade, moleja! Destaque ainda para a beringela e para a couve-de-Bruxelas. E para dois cremosos apontamentos, um de iogurte e menta, outro de alho confitado. Bem como para o poderoso jus de borrego!
Lebre – Cannellone de Estufado de Lebre / Feijão-Branco | Mais um grande momento! E que mostra como Louis Anjos se sente cada vez mais solto! A ideia foi fazer lebre com feijão-branco. Mas com leveza e elegância! Então, na base, há um subtil e aveludado creme de feijão-branco. Sobre o qual encontramos um cannellone de lebre – a massa, muito fina e delicada; a lebre, bem marinada e estufada, extremamente saborosa! No topo, crocantes de cebola e pistácio. E ainda um pouco de óleo de hortelã, para dar frescura e cortar o sabor forte da caça! Levíssimo! Elegantíssimo! Excelente!
Campolargo Castellão tinto 2009 | Uma esplêndida sugestão de Nuno Diogo. O Castellão – assim mesmo, escrito à moda antiga, de modo a identificar a casta também conhecida na Bairrada como Castelão Nacional e cujo nome oficial é Camarate. Um tinto balsâmico, com notas de fruta doce, taninos muito finos e boa acidez.
Pombo – Pombo Royal / Cevadinha / Cogumelos Selvagens / Trufa | O pombo é sempre muito especial para Louis Anjos – foi com pombo que, em 2012, venceu o concurso Chefe Cozinheiro do Ano! Prato, aliás, que chegou depois a recriar em 2018 no BON BON. Agora, a abordagem é completamente diferente. E já não há foie gras. Existindo, porém, pontos de contacto com essa criação anterior, nomeadamente as notas terrosas, os cogumelos e o vinho do Porto. Com efeito, o pombo vem muito suculento, muito saboroso, com um toque até levemente terroso! E Louis Anjos junta-lhe cevadinha, bastante apurada e ‘al dente’! Bem como cogumelos, em especial, Trompetas da Morte e Cantarelos. E, ainda, trufa negra. Mais micro folhas de pak-choi e mizuna. E destacando-se, igualmente, o saborosíssimo jus, feito com vinho do Porto! Excelente momento! E extremamente leve – é, de facto, notável que Louis Anjos seja capaz de apresentar três momentos de carne no mesmo menu, provando mais uma vez que, com leveza e elegância, “O Algarve não é só praia…”, nem é só mar!
Quinta da Lapa Reserva Merlot 2016 | Do Tejo veio a gulosa sugestão de André Pereira para o pombo, um Merlot macio e com muita fruta, assinado por Jaime Quendera e Jorge Ventura.
Coco – Coco / Manjericão / Yuzu | O reencontro com as duas (!) emblemáticas pré-sobremesas do BON BON, ambas com os mesmos sabores, mas em registos, texturas e temperaturas completamente diferentes! Um grande momento! Ou dois, na verdade! Funcionou maravilhosamente no ano passado… e, na verdade, funciona sempre!
Boletus – Boletus / Chocolate / Mirtilos | Trabalhar os cogumelos num registo doce não é novo para Louis Anjos! Poucos saberão, mas esse era um dos segredos de uma sobremesa chamada… “Do bosque, o arroz-doce e a alfarroba”… com a qual o (desde 2018) chef do BON BON ganhou o Chefe Cozinheiro do Ano… em 2012! Muitos anos já passaram, sim. Mas, entretanto, aqui temos novamente Louis Anjos à volta de uma sobremesa… de cogumelos! Agora há um gelado de Boletus, intenso. Uma ganache também de cogumelos Boletus. Uma “terra” de alfarroba. Mirtilos… inteiros, às metades e num coulis. E depois… dois deliciosos cremosos de cogumelos Boletus: um, mais doce, com chocolate branco; e outro, mais acidulado, com chocolate rubi! Uma sobremesa… extraordinária!
Soalheiro Espumante Bruto Nature 2016 | “The beginning is the end”. De modo que – comprovando a enorme versatilidade e aptidão gastronómica deste espumante Soalheiro que é produzido pelo método ancestral e não tem a fase intermédia do dégorgement – o Bruto Nature que tinha aberto o jantar… também o fechou!
Mignardises | Na caixa, uma goma de laranja; uma húmida e aveludada queijadinha de leite de cabra; e uma ganache de chocolate e medronho, sob uma base de queijo de figo! Na meia garrafa de vidro, um chocolate branco com um Porto branco, o Rozès Porto Menina 10 Anos White… e um chocolate negro com um LBV, o Rozès Porto LBV 2014.
2020 | Um ano muito desafiante para os restaurantes. O BON BON regressa já a 23 de maio.
Ver também:
Miguel Marques, o vencedor da edição de 2019
A Revolta do Bacalhau é um concurso promovido pelo Recheio Cash & Carry, pelo NSC - Conselho Norueguês da Pesca e pelas Edições do Gosto, com o objetivo de premiar as melhores receitas de bacalhau salgado seco da Noruega.
Já vai na 15.ª edição.
E este ano teve a particularidade de, na categoria dos “Cozinheiros Profissionais”, os três finalistas pertencerem a restaurantes distinguidos pelo Guia Michelin.
O vencedor foi Miguel Marques, da equipa de Ricardo Costa no THE YEATMAN (2** em Gaia) e que já passou pelo VILA JOYA.
Em segundo lugar ficou Jeferson Dias, que integra a brigada de Louis Anjos no BON BON (restaurante com 1* entre Lagoa e o Carvoeiro) após ter passado pelo GRANDE REAL VILLA ITÁLIA.
E em terceiro ficou Pedro Rodrigues, um ex-THE YEATMAN que já tínhamos encontrado aqui e que está atualmente no FIFTY SECONDS MARTÍN BERASATEGUI (novo 1* em Lisboa) cujo chefe executivo é Filipe Carvalho.
Os 3 finalistas: Miguel Marques (1.º), Pedro Rodrigues (3.º) e Jeferson Dias (2.º)
Quanto ao júri, foi novamente presidido pelo chefe Hélio Loureiro.
E composto ainda pelos chefes Hélder Diogo, Joana Duarte (TAPISCO), João Oliveira (VISTA), Rui Silvestre (VISTAS) e Vítor Adão (PLANO).
O júri
Vítor Adão, Hélio Loureiro (presidente), Joana Duarte, Rui Silvestre, João Oliveira, Hélder Diogo
Este ano, a final nacional da Revolta do Bacalhau decorreu no Espaço Espelho d'Água, em Lisboa.
E o formato foi diferente dos das últimas edições.
Todavia manteve-se a sua caraterística mais interessante: a possibilidade, dada a todos aqueles que assistem à final, de provar os pratos de cada um dos três concorrentes da categoria dos “Cozinheiros Profissionais”, antes de, no fim do jantar, o júri anunciar os vencedores.
Com efeito, os finalistas – um de cada vez – começaram por preparar na cozinha os pratos que submeteram à apreciação do júri.
Porém, de seguida, enquanto o júri degustava e deliberava à porta fechada, cada um dos concorrentes veio até à sala – um de cada vez – para uma rápida sessão de showcooking em que finalizou e empratou a versão de degustação do seu prato, que foi depois servida de forma volante.
Sessões essas de cozinha ao vivo que foram uma novidade e que se revelaram muito interessantes.
Mas que ganhariam se fosse dada aos concorrentes a possibilidade de fazerem previamente uma breve apresentação pública do seu prato.
“Bacalhau salgado seco da Noruega escondido na couve-flor” (Miguel Marques, 1.º lugar)
“Bacalhau salgado seco da Noruega em memória de mão de vaca e grão” (Jeferson Dias, 2.º lugar)
“Bacalhau salgado seco da Noruega, do passado ao presente” (Pedro Rodrigues, 3.º lugar)
Degustados na sala, os três pratos estavam todos muito bons – todos eles!
Três grandes pratos de bacalhau!
De tal forma que, pelo que pudemos ver e ouvir, a sala estava divida sobre quem deveria ser o vencedor.
Inclusivamente, depois da degustação e ainda antes do anúncio dos resultados, tivemos oportunidade de perguntar ao presidente do júri, perante estes concretos pratos, qual tinha sido o principal critério de decisão, o que é que tinha feito a diferença para a escolha ter sido a que iria ser anunciada alguns minutos depois.
E a resposta de Hélio Loureiro foi imediata, nem precisou de pensar:
«O sabor!!!»
Porém, a verdade é que todos os pratos tinham imenso sabor!
E, para quem estava na sala a assistir, os três souberam mesmo muito bem!
Pelo que, indiscutivelmente, estes concursos não são apenas uma mera questão técnica, são também uma questão de gosto, de gosto do júri – gosto em sentido amplo, gosto no sentido daquilo que o membro do júri mais valoriza na abordagem que faz a estes pratos.
De qualquer forma, como nos contou Hélio Loureiro, a escolha do júri foi unânime.
Tendo a preferência recaído no “Bacalhau salgado seco da Noruega escondido na couve-flor” de Miguel Marques.
Um prato em que o objetivo do cozinheiro do THE YEATMAN – plenamente atingido, aliás – foi o de demonstrar que “menos é mais”!
Foi o de provar que com apenas três ingredientes é possível fazer um grande prato de bacalhau!
Ou seja, com bacalhau, claro – o bacalhau salgado seco da Noruega é a proteína obrigatória do concurso.
Com couve-flor, a tal onde se escondia o bacalhau, como se dizia no nome do prato. Efetivamente, para além de um bem castanho (e muito saboroso) puré de couve-flor com manteiga noisette, havia também umas finíssimas fatias de couve-flor a cobrir o bacalhau, sobre as quais Miguel Marques ralou no fim amêndoa torrada.
E ainda – terceiro ingrediente – com cebola! Tão discreta que nem sequer do nome do prato consta! E, aliás, à primeira vista nem parecia cebola! Parecia esparguete! Porém, aquela afinal falsa pasta, que estava ao lado do bacalhau e do puré, era mesmo cebola! E estava amarela porque Miguel Marques lhe juntou filamentos de açafrão – que deram cor… e sabor! Tendo no topo zest de limão!
De facto, só por si, isto já era um grande prato de bacalhau!
Porém, certamente para compensar este lado audaz e minimalista da sua receita, Miguel Marques juntou-lhe ainda, à parte, um rissol!
Mas não era um rissol qualquer!
Fazendo a ligação com o prato, tinha um recheio de puré de couve-flor… e ainda de língua e caras de bacalhau!
Ao qual Miguel Marques arriscou – e bem – dar um toque picante, acrescentando-lhe então Tabasco Verde!
Excelente!
“Bacalhau salgado seco da Noruega escondido na couve-flor” (Miguel Marques, 1.º lugar) – versão de degustação
“Bacalhau salgado seco da Noruega em memória de mão de vaca e grão” (Jeferson Dias, 2.º lugar) – versão de degustação
“Bacalhau salgado seco da Noruega, do passado ao presente” (Pedro Rodrigues, 3.º lugar) – versão de degustação
Em segundo lugar ficou o prato de Jeferson Dias, “Bacalhau salgado seco da Noruega em memória de mão de vaca e grão”, com o cozinheiro do BON BON a apostar nos sabores tradicionais – fortes e profundos – e em que a grande surpresa foi ter um toque ligeiramente doce!
E na terceira posição ficou a arrojada criação de Pedro Rodrigues “Bacalhau salgado seco da Noruega, do passado ao presente”.
Arrojada, não apenas em termos de sabores mas também visualmente – era o mais bonito dos três pratos – e, em especial, em termos de texturas.
Tendo-nos feito pensar na muitas vezes subestimada mas sempre decisiva importância da loiça e dos talheres para que a experiência resulte plenamente.
Com efeito, como se vê nas fotografias, tirando a (ótima) língua de bacalhau panada, os acompanhamentos da posta de bacalhau do cozinheiro do FIFTY SECONDS eram cremosos, quase líquidos.
Ora, na versão de degustação, servida num pequeno prato côncavo que mais parecia uma taça, o que sentimos falta foi apenas o não existir uma colher para apanhar todos aqueles saborosíssimos líquidos.
Não sentimos qualquer necessidade de que o conjunto tivesse elementos mais sólidos, apenas gostaríamos de ter tido uma colher, para poder desfrutar do prato como ele merecia.
Porém, não sei como terá sido a experiência do júri.
Mas receio que – para além da questão da colher versus acompanhamentos mais sólidos – a opção do concorrente pela apresentação desta criação ao júri num prato praticamente raso também possa não ter ajudado.
Miguel Marques (1.º lugar)
Jeferson Dias (2.º lugar)
Pedro Rodrigues (3.º lugar)
A Revolta do Bacalhau não é, no entanto, um concurso dedicado somente aos cozinheiros profissionais.
Existem, ainda, mais duas categorias.
Uma é para “Estudantes de Cozinha”.
Na qual triunfou Ruben Cardoso (Dual Qualificação Profissional) com uma “Açorda de bacalhau salgado seco da Noruega aromatizado com dill”.
Em segundo lugar ficou Marcos Sousa (Escola de Hotelaria e Turismo do Algarve) com “Os grelos de bacalhau salgado seco da Noruega”.
E, em terceiro, Bruna Ferreira (Escola Profissional do Vale do Tejo) com “Bacalhau salgado seco da Noruega e as texturas do mundo”.
Ruben Cardoso (ao centro), vencedor da categoria “Estudantes de Cozinha”, com Marcos Sousa (esq.) e Sérgio Gomes (dta.)
A terceira categoria a concurso – para além da dos cozinheiros profissionais e da dos estudantes de cozinha – é a dos “Restaurantes”.
Com Diploma de Ouro (pontuação acima dos 90 pontos) foram distinguidos BACALHAU & AFINS (Aveiro), BARÃO DE FLADGATE (Gaia), CANTINHO DA SOTA (Coimbra), FERRUGEM (do chef Renato Cunha, Famalicão), GALANTE (Figueira da Foz), GRANADA (São Martinho do Porto), HOTEL DUNA MAR (Monte Gordo), ORIGENS (do chef Gonçalo Queiroz, Évora), SETE (Coimbra) e TSUKIJI (do chef Paulo Morais, Lisboa).
Tendo o grande vencedor sido o GRANADA, do chef Eulitério Afonso, com “Bacalhau salgado seco da Noruega, puré de chícharo, gema confitada e espuma de coentros e lima”.
O Diploma de Prata foi para os restaurantes A ESTRELA DA MÓ (São Miguel de Poiares), ALKIMYA (Covilhã), CAFÉ NICOLA (Figueira da Foz), CASA CHEF VICTOR FELISBERTO (Alferrarede), DOTE CERVEJARIA (Lisboa), MESA REAL (Bussaco), O BUKE (Pampilhosa da Serra), PALATIUM no Pestana Palácio do Freixo (Porto), PALATIVM (São Silvestre), SENSES (Lagos), VERDURE RESTAURANTE (Quinta do Conde), VILLA LAUSANA (Lousã) e XISTO (Louçainha).
Receberam ainda Diploma de Bronze os restaurantes FONTE D’OURO (Valença), LA TERRAZA (Lagos), QUINTA DO PRÍNCIPE (Chaves), RESTAURANTE VESTIGIUM (São Bartolomeu de Galegos) e VAL MOREIRA (Armamar).
GRANADA, em São Martinho do Porto, o vencedor da categoria “Restaurantes”
Por fim, uma referência para os simpáticos prémios atribuídos aos vencedores.
Com efeito, o cozinheiro profissional, o estudante de cozinha e o restaurante mais bem classificado da sua categoria recebeu uma entrada no Congresso dos Cozinheiros 2020, uma assinatura anual da revista INTER Magazine e, ainda, uma estimulante viagem de formação à Noruega, com uma duração mínima de quatro dias, e que inclui transporte, alojamento e alimentação.
Parabéns a todos!
Miguel Marques ganhou uma viagem à Noruega
Ver também:
Joaquim de Sousa, Pedro Mendes, Louis Anjos
A mais recente edição do evento “O Chef Convida”, que tem trazido ao Alentejo Marmòris, em Vila Viçosa, nomes de referência da cozinha portuguesa, transformou-se numa memorável noite de clássicos.
O anfitrião Pedro Mendes, para além de olhar para o futuro e testar com sucesso um novo prato, apresentou a sua emblemática cebola com pezinhos de coentrada.
Louis Anjos trouxe do BON BON o lavagante de assinatura, bem como o seu depurado salmonete com presunto que fez a ponte para sabores mais alentejanos.
E Joaquim de Sousa fechou o jantar em grande estilo com a famosa Flor Surpresa – uma sobremesa que tem movimento – a que se seguiram os petits fours da alta pastelaria do JNĉQUOI e da LADURÉE.
Já os vinhos estiveram por conta da Quinta do Mouro, de Miguel Louro. Tendo acontecido uma situação absolutamente extraordinária: cada um deles era tão bom e tão gastronómico que acabou por ficar bem… com todos os pratos! Efetivamente, a cada novo prato, um novo vinho, ainda melhor do que o anterior; mas a verdade é que todos os vinhos anteriores… também ficariam bem, e ficaram, com esse novo prato! Vinhos sempre secos e austeros, com uma acidez vibrante!
Os aperitivos começaram no bar do hotel e com dois vinhos que nem parecem ser entrada de gama
Vinha do Mouro branco 2018
Vinha do Mouro tinto 2015
Já na sala, as boas-vindas foram dadas pelo chef Pedro Mendes, a que se seguiram breves intervenções de Louis Anjos, Joaquim de Sousa e Miguel Louro
O menu do jantar
A servir de base para os snacks…
… uma fusão da bolota alentejana do NARCISSUS com a alcagoita de Aljezur do BON BON
De modo que os três snacks – chamados “Surpresas da nossa cozinha” – chegaram efetivamente entre bolotas e alcagoitas: o falso amendoim de Louis Anjos, na verdade uma mousse fria de frango, gengibre e amendoim; o bombom de foie gras com amendoim, homenagem de Pedro Mendes ao chef pasteleiro Joaquim de Sousa; e ainda o croquete de bolota de Pedro Mendes, com farinheira e, no topo, compota de cebola
Harmonizados com o Zagalos Branco Reserva 2017, que teve um estágio de 6 meses em barrica usada e algum contacto pelicular
Azeite e manteiga
Seleção de pães
O empratamento do lavagante
Louis Anjos na sala…
… apresentando o seu prato…
… e servindo o consommé de lavagante com açafrão!
“Lavagante azul, tangerina, açafrão e beterraba” (Chef Louis Anjos)
Zaga Luz 2018, a tentativa de fazer um tinto mais leve, a partir de Trincadeira e Petit Syrah, entre outras, colhidas mais cedo, com pouca extração, menos cor, sem madeira e com menor graduação alcoólica – imensa acidez!
Pedro Mendes e os taleigos…
… entregues individualmente a cada pessoa, com mais uma surpresa da cozinha do Marmòris:
Um pão de bolota, com chouriço alentejano... acabado de cozer e ainda quente!
O empratamento dos pezinhos
“Cebola e pezinhos de coentrada” (Chef Pedro Mendes)
Erro B 2016, um branco sem madeira que fermentou com contacto pelicular total – grande estrutura e grande acidez!
O empratamento do salmonete
“Salmonete de Sagres, molho de fígados, miga de tomate e presunto de bolota” (Chef Louis Anjos)
100% fermentado em madeira, o Quinta do Mouro branco 2017…
… do produtor Miguel Louro
O empratamento do borrego
“Borrego, café de bolota [o molho servido na mesa] e legumes da época” (um futuro prato do Chef Pedro Mendes)
Quinta do Mouro Petit Verdot tinto 2016! Uma novidade! É a primeira colheita… e ainda não foi lançada para o mercado! Aromas florais, fruta preta e excelente acidez!
O molho quente da sobremesa…
… que Joaquim de Sousa vem servir à mesa, para abrir a Flor Surpresa
“Flor de chocolate negro” (Chef Joaquim de Sousa)
Erro Z rosé 2018
Petits fours (Chef Joaquim de Sousa)
Financier de pistáchio com framboesa, Macaron de alcaçuz, Ópera (café + chocolate), Creme de arroz- doce sobre bolacha de canela e pimenta
O agradecimento final da sala a toda a equipa de cozinha
Ver também:
NARCISSUS
Alentejo Marmòris Hotel & Spa, Largo Gago Coutinho, 11, Vila Viçosa, Portugal
Chef Pedro Mendes
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