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Chef Miguel Laffan
Constituída em 2003, a Confraria da Cerveja é uma entidade sem fins lucrativos que tem como missão defender o património da cerveja em Portugal, promovendo a sua divulgação, prestígio e dignificação.
Ora, para demonstrar que a cerveja também tem lugar à mesa da alta cozinha, a Confraria da Cerveja promoveu um jantar no restaurante ATLÂNTICO de Miguel Laffan, no Monte Estoril, em que as criações do premiado chef cascalense foram harmonizadas exclusivamente com esta bebida milenar.
Porém, tendo em vista a obrigatória salvaguarda da independência da Confraria, cujas normas internas impedem que a sua atividade possa ser associada a marcas comerciais, as cervejas foram identificadas somente pelo seu estilo.
O que tornou a celebração ainda mais especial e estimulante!
Oceano Atlântico
Para começar logo com mar, ostras – ostras Découverte do Sado.
Ostras Découverte e Molho Vinagrete
Tendo a sommelier de cerveja Teresa Santos proposto uma Stout de aveia!
Uma escolha, para muitos, completamente surpreendente.
Com efeito, à primeira vista, as ostras parecem funcionar muito melhor com Champagne, ou com um Branco seco e mineral, ou até com uma Pilsener, do que com uma cerveja Preta.
Mas, em países como a Irlanda e não só, é já muito antiga esta tradição de beber uma Stout com ostras.
E a verdade é que a harmonização resultou!
A salinidade da ostra atenuou as notas torradas e de café da cerveja Preta.
E a cremosidade da aveia compensou a viscosidade e também aquele lado mais cru e áspero da ostra, que se sente em especial quando é apreciada completamente ao natural.
Aliás, este pairing é tão perfeito que até há produtores de Stout que lhe chegam mesmo a adicionar… ostras!
Oat Stout
Mas a harmonização da Stout não ficou por aqui!
Com efeito, para acentuar ainda mais a vertente gastronómica desta cerveja escura, com notas tostadas e sugestões de café e caramelo, Miguel Laffan juntou-lhe ainda um delicioso snack.
Bastante salino mas com apontamentos doces, sobre um crocante de cebola o chef do ATLÂNTICO colocou bacalhau, puré de grão, beterraba, tomate cherry, codium e chalota.
Tão bom, era para comer de uma só vez!
E para repetir várias vezes!
Amuse-bouche…
… de bacalhau
A seguir, um cocktail de camarão – “o prato mais vendido nos anos 80”, como o apresentou o chef, meio a sério, meio a brincar.
Mas, aqui, reinterpretado à Laffan.
Ou seja, muito mais intenso!
E também bastante mais leve e cremoso!
Um sucesso absoluto!
Aliás, uma versão simplificada deste prato já tinha feito furor no Peixe em Lisboa deste ano.
Cocktail de Camarão…
… versão 2019
Quanto ao pairing, Teresa Santos foi fiel ao hábito de se acompanhar o cocktail de camarão com uma imperial.
Pelo que a cerveja escolhida foi mesmo uma Pale Lager, muito leve e refrescante.
Pale Lager
Continuando com o mar, Miguel Laffan fez chegar à mesa uma miga de berbigão.
“Mar & Coentros”, como lhe chamou o chef.
E, de facto, assim era!
Estava maravilhosa!
Um grande momento, aparentemente tão simples e, afinal, tão poderoso!
Miga de Berbigão
Ora, para acompanhar a explosão de mar e coentros de Miguel Laffan, a escolha foi uma Witbier em que sobressaía precisamente o perfume dos coentros – o que ligava de modo maravilhoso com o prato – e em que também se destacava alguma acidez cítrica, que estava igualmente presente na criação do chef do ATLÂNTICO.
Witbier
Como este jantar era dedicado ao mar, Miguel Laffan não apresentou carne.
Tendo o prato principal sido garoupa!
À qual depois o chef do ATLÂNTICO juntou mexilhões.
E também um extraordinário molho de açafrão e Champagne, extremamente intenso mas bastante leve – duas características sempre muito presentes na cozinha de Miguel Laffan.
Garoupa e Mexilhão com molho de Açafrão e Champagne
Já a proposta da sommelier de cerveja foi uma Session IPA.
Ou seja, uma Indian Pale Ale suavizada e com um amargor não demasiado intenso, apenas o suficiente para cortar o açafrão.
Session IPA
Entretanto, como estávamos num jantar da Confraria, foi distribuído, por cada uma das mesas, um questionário sobre cerveja e sobre a própria Confraria.
Quiz sobre Cerveja
A nossa mesa acabou por não ser a vencedora deste mini concurso.
Mas se tivesse havido um prémio para a equipa mais divertida, a vitória estaria garantida!
Filipe Ramalho, chef do Torre de Palma Wine Hotel e porta-voz da nossa mesa
Entretanto, por fim, chegou a sobremesa.
Tendo o último momento de Miguel Laffan sido também o primeiro – e o único – em que o chef de Cascais não abordou o tema do jantar, o mar.
Era uma excelente mousse de queijo chèvre com framboesas, gomas de cerveja e um toque de mel.
Tão boa, aliás, que, apesar de ser uma sobremesa, não estava muito longe de também ser um prato de queijo.
E em que – mais uma vez e à semelhança do que já tinha acontecido antes – as duas principais características eram a elevada intensidade de sabor e a enorme leveza.
De facto, é impossível não sentir isto na elegante cozinha de Miguel Laffan – o sabor e a leveza são uma constante de todos os pratos do chef do ATLÂNTICO.
Mousse de Queijo Chèvre com Framboesas e Gomas de Cerveja
Ora, que cerveja escolher então para acompanhar uma sobremesa?
A resposta não se adivinhava fácil.
Tendo sido aguardada com uma elevada expectativa.
Efetivamente não é habitual uma cerveja ser a primeira escolha para acompanhar uma sobremesa.
Ainda para mais num país de Portos, Madeiras e Moscatéis.
Ora, a sugestão da sommelier Teresa Santos foi completamente desconcertante!
O que foi acentuado pelo facto de – e bem – as bebidas terem sido sempre servidas antes da chegada do correspondente prato.
Ou seja, sabíamos, da leitura do menu distribuído no início do jantar, que a sobremesa de Miguel Laffan era uma mousse de queijo de cabra e que o pairing seria feito com uma Berliner Weisse.
E depois chega a cerveja!
Foi então o choque total!
A “Branca de Berlim”, afinal, não era branca – era praticamente encarnada!
A elevada acidez que tipicamente a caracteriza era tão forte que até se sentia só pelo aroma – houve aliás quem, ainda sem a provar, tivesse perguntado se o copo estava bem lavado, tal era a sua exuberância aromática.
E depois, na boca, apesar de ser para acompanhar uma sobremesa, não tinha qualquer rasto de doçura – era completamente seca!
Mas, a seguir, chega a sobremesa!
E aí a interação entre as duas produz um fenómeno extraordinário.
A sobremesa muda a cerveja!
Com efeito, não é só a acidez da Berlier Weisse que corta a doçura da sobremesa!
Com o toque levemente doce da mousse e do mel, a cerveja também se transforma e de um modo extremamente marcante – perde aquela agressividade e rudeza que tinha inicialmente quando bebida sozinha, ficando muito mais suave e delicada!
Já quanto à cor e ao facto de esta Branca ser encarnada, Teresa Santos explicou que tinha escolhido uma Berliner Weisse cuja receita é bastante original, tendo… ameixa!
Ameixa essa que, para além de acrescentar ainda mais acidez à cerveja – e ligar muito bem com as framboesas da sobremesa de Laffan – também lhe dava cor!
Foi, pois, um grande pairing – em que o segredo da sommelier foi pensar não no doce mas no queijo!
Efetivamente, com Chèvre, a Berliner Weisse liga maravilhosamente!
Pelo que, com esta versão de Chèvre mais doce e mais ácida, mas que quase parece um prato de Chèvre, também ligou muitíssimo bem!
Foi, porém, a harmonização mais polémica da noite – ainda mais do que a inicial, a das ostras com cerveja Preta.
E também a menos consensual.
Mas foi igualmente a mais interessante!
Berliner Weisse
Um grande momento e uma grande harmonização a terminar um estimulante jantar, sempre com a cerveja à mesa da alta cozinha de Miguel Laffan!
Miguel Laffan at ATLÂNTICO
Avenida Marginal, 8023, Monte Estoril, Portugal
Chef Miguel Laffan
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