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Guia Boa Cama Boa Mesa despromove BELCANTO

por Raul Lufinha, em 04.03.20

Prémios guia Boa Cama Boa Mesa: Rui Paula é o Chef do Ano 2020

Prémios guia Boa Cama Boa Mesa: Rui Paula é o Chef do Ano 2020

Decorreu ontem à tarde, na sede da Impresa, em Paço de Arcos, a cerimónia de entrega de prémios do guia Boa Cama Boa Mesa 2020, o qual, para além de ter atribuído os galardões Carreira e Chef do Ano, distinguiu também os melhores alojamentos (Chave de Platina, Ouro e Prata) e os melhores restaurantes portugueses (Garfos de Platina, Ouro e Prata).

 

Os resultados completos estão disponíveis aqui.

Tendo a grande surpresa sido a despromoção do BELCANTO.

 

Com efeito, para o guia do Expresso, continuam a existir somente quatro restaurantes de topo em Portugal.

Porém, ao FEITORIA de João Rodrigues e ao OCEAN de Hans Neuner, que o ano passado já eram Garfo de Platina, juntam-se-lhes agora o CASA DE CHÁ DA BOA NOVA de Rui Paula, que também foi considerado Chef do Ano, e o THE YEATMAN de Ricardo Costa.

Ou seja, o restaurante de José Avillez, que em 2019 tinha sido distinguido com um Garfo de Platina – o galardão máximo – e era então um dos quatro melhores restaurantes do país (a par do FEITORIA, OCEAN e SÃO GABRIEL) foi este ano despromovido para a categoria intermédia do Garfo de Ouro, à qual curiosamente ascendeu o seu vizinho ALMA de Henrique Sá Pessoa.

O que tem também como consequência que, no entendimento do guia do Expresso, o FEITORIA passa a assumir sozinho o título de melhor restaurante da capital.

 

Sendo, pois, surpreendente esta decisão do Boa Cama Boa Mesa de baixar o nível do BELCANTO.

Ainda por cima quando é o mais antigo duas estrelas Michelin de Lisboa (distinção na cidade só atribuída igualmente ao ALMA).

E, em especial, quando é atualmente o único representante português na restrita e prestigiada lista dos 50 melhores restaurantes do mundo – a classificação de 2020 será anunciada a 2 de junho e em 2019 o BELCANTO alcançou o lugar número 42, a melhor posição de sempre obtida por um chefe português.

 

Quais os motivos para esta despromoção do BELCANTO?

 

O Boa Cama Boa Mesa não o diz diretamente.

Mas, a meio do parágrafo de apresentação do restaurante, vem uma referência de tom crítico que parece ser a justificação do guia do Expresso para esta decisão:

«A carta mantém-se quase na mesma, até porque os inspetores gostam de consistência, apenas com uma ou outra inclusão, sempre com a genialidade que caracteriza José Avillez. Compreendendo-se a ambição, lamenta-se que a inovação seja comedida, até porque se está a falar daquele que é seguramente um dos melhores e mais criativos chefs nacionais.»

 

Inovação?

 

É estranho.

 

Efetivamente, quando vamos consultar os critérios – e os subcritérios – que o guia seguiu em 2020, deles não consta qualquer referência à inovação:

«Na vertente Boa Mesa, a seleção dos melhores foi orientada por critérios de avaliação a partir de cinco grandes áreas: comida (produtos, confeção, apresentação e ementa), local (localização, sala, amesendação, talhares [sic], decoração, vista e ambiente), serviço (serviço de mesa, tempo de espera, aconselhamento e relacionamento com clientes), garrafeira (quantidade, diversidade e qualidade, serviço e aconselhamento, serviço de copos, qualidade/preço e serviço de vinho a copo) e relação preço/qualidade (geral).»

Fazendo, aliás, todo o sentido que a inovação não seja um critério para escolher – como se diz na capa do guia – «os melhores restaurantes de Portugal».

Porque a inovação é instrumental.

É uma ferramenta.

É neutra.

Tanto se pode inovar para melhor como para pior.

Pelo que o importante não é inovar.

O importante é fazer bem.

O importante é mudar para melhor.

Mudar por mudar, não tem qualquer interesse.

A inovação, quando muito, é decisiva para escolher os mais inovadores.

Não para escolher os melhores.

Pelo que faz todo o sentido a inovação não ser um critério em si mesmo.

 

Porém, este conjunto de critérios apresentando pelo guia Boa Cama Boa Mesa levanta outras perplexidades.

 

É que se foi mesmo a inovação – ou a ausência dela – que fundamentou uma descida da classificação de um restaurante, então o leitor deveria ser informado de que o guia, para além dos critérios que enuncia, também segue este.

Ou seja, terá sido seguido um critério que oficialmente não é critério.

Um critério que não foi dito que existia.


Já se a causa não foi a inovação, então o leitor deveria ser informado das razões pelas quais, de um ano para o outro, é retirada a classificação máxima a um restaurante.

 

Além de que, na carreira de José Avillez, este tema da inovação não é novo.

E não o impediu de chegar onde chegou – nomeadamente ao Garfo de Platina.

Com efeito, já em 2012, no mês de abertura do seu BELCANTO, Avillez lançou um pequeno “caderno de esboços” que fechava com os então 23 mandamentos da sua cozinha.

O número 14 dizia assim:

«Para fazer diferente é preciso fazer tão bom ou melhor. Caso contrário, o melhor é fazer igual. Criar por criar não é premiado!»

Ora, de facto, fazer igual até pode justificar a não promoção.

O que não justifica é a despromoção.

Quem merece ser despromovido é quem faz pior.

Não é quem faz igual.

Quem continua a fazer igual o que faz bem, continua a fazer bem – não merece ser despromovido.

 

Tudo isto é muito estranho.

 

Efetivamente, uma das diferenças entre um guia produzido por uma empresa de pneus e um guia produzido por um jornal é que este último tem a mais-valia de ser feito por jornalistas.

Que privilegiam não a opacidade e o secretismo mas a informação.

Daí devermos sempre esperar ser informados dos critérios efetivamente seguidos e da fundamentação das suas decisões.

Nomeadamente quando se retira a classificação máxima a um restaurante.

Ainda para mais, a um restaurante que acabou de entrar para a lista dos 50 melhores do mundo.

 

Ver também:

 

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publicado às 17:25



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Raul Lufinha

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