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«És do João Rodrigues?»

por Raul Lufinha, em 30.01.20

Os vencedores dos Prémios Mesa Marcada 2019

Os vencedores dos Prémios Mesa Marcada 2019

Em meados deste mês, na semana anterior à da cerimónia de entrega dos prémios do blog Mesa Marcada de Duarte Calvão e Miguel Pires, encontrei por acaso na rua um amigo com quem já não estava há algum tempo – e que não pertence ao meio gastronómico embora saiba que costumo participar na votação – o qual, a meio da rápida conversa, me perguntou:

«E então, és do João Rodrigues?»

Ainda a sorrir com a inusitada questão surgida do nada, comecei por lhe dizer que no passado até já tinha votado João Rodrigues, mas que este ano não o podia fazer – de acordo com as regras, só podemos indicar restaurantes que tivéssemos visitado ao longo do respetivo ano; e em 2019, apesar de ter comido pratos do João Rodrigues noutros sítios, não fui ao FEITORIA.

Entretanto, a conversa acabou por fluir por outros caminhos e tivemos que nos despedir sem ter sido possível voltar ao tema da votação.

De modo que não lhe cheguei a dizer que aquela pergunta – apesar de divertida – partia de um pressuposto errado.

É que isto não é um Benfica-Sporting.

Claro que há imensas pessoas, imensos clientes, para quem a ida a um restaurante é uma atividade grupal. A sua lógica – completamente legítima, aliás – é a de que vamos “aos de que gostamos”, vamos “aos nossos”. É uma atividade de pertença – a um grupo, a uma comunidade.

Contudo, para mim, a gastronomia não é assim tão básica, não é assim tão primária, não é assim tão linear.

Não são os bons contra os maus.

Não é como brincar aos polícias e aos ladrões. Ou aos índios e aos cowboys.

Nós contra eles.

Os nossos. E os outros.

Não.

Para mim, enquanto cliente, não há os do nosso clube (seja ele um chefe, um restaurante, uma região ou um estilo de cozinha) e depois os outros, os dos outros clubes, os nossos rivais, aqueles que têm que perder para que nós possamos ganhar.

Daí que este tenha sido o ano mais estranho dos Prémios Mesa Marcada. Foi aquele em que tivémos as melhores condições para assistir à cerimónia – que decorreu no anfiteatro da Gare Marítima de Alcântara, em Lisboa. Mas foi também aquele em que mais se viveu um festivo ambiente de claque – vista cá de cima e atrás da última fila, não parecia tanto a audiência de um evento gastronómico, parecia muito mais a bancada da equipa da casa de um recinto desportivo! De tal forma que enquanto ia decorrendo a entrega dos sucessivos prémios – que culminaram novamente na consagração de João Rodrigues e do FEITORIA – só me vinha à cabeça a futebolística pergunta sobre de que chefe eu seria…

Porém, efetivamente e cada vez mais, não vejo os restaurantes como uma competição desportiva.

Para mim, ir a um restaurante não é sair de casa para ir apoiar a nossa equipa!

Não!

E, já agora, também não é propriamente para ir comer que vou a um restaurante – se fosse só para comer, comeria em casa.

Para mim, ir a um restaurante é como ir a um museu.

Ao qual vamos para conhecer o trabalho de um determinado autor.

Não havendo competições entre museus. Nem entre pintores.

Cada um tem o seu estilo, a sua abordagem, a sua identidade, a sua linguagem, a sua obra.

E o mais importante não é julgá-la, classificá-la, hierarquizá-la.

O mais importante não é escolher a melhor.

Nem é, sequer, apurar ou identificar aquela de que mais gostamos ou que é a nossa preferida.

Não!

O mais interessante é conhecer!

Conhecer o máximo possível!

E tentar aprender!

E tentar compreender!

Sem julgamentos.

Sem competições.

Tentando apenas apreender o melhor de cada espaço e de cada chefe.

Daí que, apesar de altamente gratificante – obrigado Duarte e Miguel pelo convite –, votar neste género de prémios seja igualmente, para mim, um exercício doloroso e injusto. Obriga a escolher uns e a preterir outros – quando gostamos de todos (ou quase); naturalmente, de uns mais por umas razões, de outros mais por outras. E doloroso ainda também, claro, porque, como todos os votantes, só podemos votar nos que visitámos nesse ano – sendo difícil (impossível mesmo), a cada novo ano, voltar a visitar todos aqueles de que mais gostamos ou de que mais gostámos, de norte a sul do país e nas ilhas, e, bem assim, conhecer igualmente cada um dos novos projetos que estão sempre a surgir.

De qualquer modo, todos estes prémios, todas estas estrelas, todos estes guias – que há hoje em dia – revelam-se de uma extrema importância.

Não são absolutos, claro – nenhum deles é.

Mas todos eles, apesar das suas inerentes limitações, nos dão pistas valiosas sobre aquilo que vale a pena conhecer!

 

Ver também:

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 23:17


2 comentários

De Anónimo a 31.01.2020 às 11:47

BRAVO !!!!👏👏👏👏
EXCELENTE TEXTO !!

De Raul Lufinha a 31.01.2020 às 13:31

Muito obrigado!!!

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