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Chef Artur Gomes na sala do ERVA
Maio de 2019 é um mês histórico na carreira de Artur Gomes.
No dia 1, o jovem cozinheiro, de apenas 26 anos então acabados de fazer, estreou o seu primeiro menu como chefe de cozinha.
Foi no ERVA, restaurante de rua integrado no Hotel Corinthia, em Lisboa, anteriormente liderado pelo chefe Carlos Gonçalves.
Ora, ainda em maio, o Mesa do Chef teve a oportunidade de assistir a uma apresentação da nova cozinha do ERVA, conduzida pelo próprio chefe executivo, Artur Gomes, e pela diretora do restaurante, Cheila Queirós.
Contudo, não foi a primeira vez que falámos com Artur Gomes.
Tal acontecera bem antes, em abril do ano anterior, no Symposium 2018 do Sangue na Guelra, a propósito da então já anunciada ida de Artur Gomes seis meses para o NOMA e de infelizmente não nos irmos afinal encontrar em Copenhaga – a nossa visita para o primeiro seafood menu do NOMA 2.0 (apenas registada no instagram do Mesa do Chef, ao contrário do que tinha sucedido em 2013) ocorreu no início de maio e Artur Gomes só chegaria semanas depois, mas ainda antes do fim da temporada inaugural do novo NOMA.
Curiosamente, Artur Gomes foi depois um dos temas da nossa conversa com René Redzepi durante a visita à cozinha, a meio desse jantar. Não é novidade que o chefe do NOMA, devido à ligação da sua mulher Nadine com Portugal, tem um especial carinho pelo nosso país e uma grande vontade de cá vir, não apenas para conhecer os produtos portugueses e a nossa cozinha, mas também para cozinhar em Portugal! Sendo esse um dos seus objetivos a partir de 2020, quando passarem dois anos após a relocalização do seu premiado restaurante. Pelo que ficou encantado quando lhe dissemos que, ainda antes do final desse mês de maio de 2018, chegaria ao NOMA um jovem cozinheiro português com um excelente currículo e que já tinha trabalhado com os irmãos Roca. E com quem aliás tínhamos estado a falar de Copenhaga num festival gastronómico, realizado 15 dias antes em Lisboa, cujo cabeça de cartaz tinha sido precisamente o seu amigo Alex Atala. Aliás, René Redzepi ficou de tal forma contente com a notícia da chegada de Artur Gomes que inclusivamente mandou alguém da equipa tomar nota desse facto.
Entretanto em Copenhaga, Artur Gomes – que, para além do EL CELLER DE CAN ROCA, já tinha passado igualmente pelo BELCANTO de José Avillez – esteve colocado no laboratório de fermentação do NOMA.
E o mais fascinante é que agora, para além da ética e da estética do NOMA, Artur Gomes trouxe também para a sua cozinha todas essas técnicas!
Ou seja, para a sua cozinha no ERVA!
Uma cozinha cuja base, conforme nos confidenciou Artur Gomes, é sempre o produto – tudo é construído a partir daí.
E em que, efetivamente, se sente muito mundo!
E muita maturidade!
De tal forma que, continuando assim com este nível tão elevado, Artur Gomes vai ser seguramente um caso sério na cozinha portuguesa!
Sala | Tudo muito verde. Existindo inclusivamente paredes forradas com trepadeiras e jardins verticais.
Mesa | Simplicidade.
Carta | A primeira carta assinada por Artur Gomes: couvert + 5 entradas + 9 pratos principais + 4 sobremesas.
Seleção de Pães do Dia (da padaria GLEBA), Manteiga Batida e Azeite Monterosa Premium Picual | Logo no couvert, duas notas que se irão manter ao longo de todo o menu e que depois se percebe serem um traço identitário da cozinha de Artur Gomes: produto de qualidade e registo minimalista.
Caranguejo, Consommé de Flores e Morangos Verdes | Muito complexo! E muito perfumado! Sendo o salgado do mar cortado pelas notas florais e aciduladas da vinagreta de camomila com óleo de flor de sabugueiro. E cortado também pelos morangos verdes que se escondem na carne do caranguejo, os quais, num registo parecido com o dos picles, mantêm uma acidez viva mas que, devido a Artur Gomes recorrer à técnica da lacto-fermentação – olá NOMA –, perderam a doçura, ficando salgados…! Ou seja, marisco, flores… e fruta levemente ácida, não doce mas salgada! Excelente!
Milfolhas de Aipo com Ragoût de Cereais | Uma entrada vegetariana. De um lado, o guloso aipo laminado, que foi ao Josper e tem manteiga noisette, ficando suculento, levemente crocante, fumado e untuoso. E do outro, um apurado ragoût sem carne, só de cereais – tem aveia, centeio, trigo-barbela e arroz – em que o segredo de Artur Gomes é cozinhar cada um deles separadamente, de modo a todos ficarem “al dente”, pois cada um tem o seu próprio tempo de cozedura. Sendo depois a entrada finalizada com umas folhas de mostarda da horta do próprio ERVA. Excelente!
Arroz Carolino e Gamba da Costa | O brutal arroz de gambas de Artur Gomes! Com efeito, o arroz é cozinhado num caldo de peixe e gambas ao qual o chef junta pimentão, de modo a ganhar complexas notas, simultaneamente, salgadas, doces, fumadas e picantes. Já as gambas da costa levaram apenas um ligeiro calor no Josper e vão depois cozinhando levemente em cima do arroz, que, além do pimentão, esconde ainda uma outra surpresa – para dar ainda mais textura ao arroz já de si “al dente”, há também pequenos pedaços de… choco! Excelente!
Vaca Arouquesa e Cebola Nova | O minimalismo da cozinha de Artur Gomes está igualmente bem patente no bife de vaca Arouquesa maturada, que vem acompanhado simplesmente de cebola! Apenas dois elementos, carne e cebola! A carne está perfeita, muito suculenta e saborosa. Já a cebola, vem em picle e em puré. E o puré, então, é algo absolutamente do outro mundo – um cremoso e acastanhado puré de cebolas que foram ao Josper, o qual, para além da textura sedosa, tem um poderoso e complexo sabor, pleno de notas doces, ácidas e fumadas, trazendo inclusivamente à memória elementos que não estão no prato, como o fumeiro e os enchidos. Inacreditavelmente, o puré, apesar de ser tão rico de sabores, não tem nem chouriço, nem presunto, nem bacon, nada – é só mesmo cebola! Excelente!
Texturas de Ameixa | Se Artur Gomes já era minimalista porque fazia pratos com apenas dois elementos, pois, nesta sobremesa, foi ainda mais longe! Há apenas um elemento! Só um! Ameixa! Mas não é uma sobremesa monocórdica! Bem pelo contrário! Sendo também de notar que aqui Artur Gomes, fazendo a ponte com os morangos verdes da entrada inicial, volta a utilizar a técnica da lacto-fermentação. De um lado, temos pedaços de ameixa (com casca, o que reforça o sabor e a textura) marinada em água de lúcia-lima. Do outro, surge um complexo e pouco doce sorbet de ameixa, extremamente cremoso. Excelente!
Café | A terminar, com os cafés – um para o Mesa do Chef, outro para o Chef do ERVA – um pequeno chocolate.
ERVA | Um restaurante único. E imprescindível.
ERVA
Av. Columbano Bordalo Pinheiro, 105, Lisboa, Portugal
Chef Artur Gomes
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