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Enólogo José Carvalheira, Enólogo Paulo Nunes, Eng. José Paulo Dias, Eng.ª Vanda Pedroso
No âmbito da Feira do Vinho do Dão de 2018, que decorreu na vila de Nelas, o Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão promoveu uma prova dos seus vinhos mais raros e antigos.
Tendo abrangido os brancos e os tintos, produzidos no centro, dos anos 50 a 90 do século XX – uma colheita por década.
A seleção foi efetuada pelos enólogos Paulo Nunes (muito elogiado pelo seu trabalho na Casa da Passarella) e José Carvalheira (que já tínhamos assistido a conduzir uma prova de vinhos antigos das Caves São João, brancos e tintos).
E teve, esta prova, como objetivo, não apenas mostrar o que foi o Dão – uma região com 110 de anos história, dos quais mais de metade representados nesta prova – mas também, e principalmente, o que poderá ser o Dão e quais os melhores caminhos para o futuro da região.
Como habitualmente, primeiro foram provados os brancos e só depois os tintos.
Tendo-se começado, porém, pelo vinho mais antigo, até se chegar ao mais recente.
E o resultado foi absolutamente memorável.
Conforme comentou Paulo Nunes, que conduziu a prova, «foram momentos únicos, que se têm uma vez na vida!»
«São vinhos que nos esmagam!»
De facto, o primeiro branco, de 1958, com uns inacreditáveis 60 anos de idade (!), extremamente complexo, apresentava ainda uma acidez surpreendentemente vibrante, crocante mesmo. Tendo sido obtido a partir de nove castas: Malvazia Fina, Encruzado, Bical, Cercial Branco, Gouveio, Barcelo (a variedade mais importante no Dão em meados do século passado!), Uva Cão, Terrantez e Rabo de Ovelha. Com efeito, quantos de nós chegaremos aos 60 anos? E quantos de nós chegaremos aos 60 anos com este vigor?
Entrando nos pormenores mais técnicos, Paulo Nunes explicou que este 1958, tal como os seguintes, foi vinificado com engaço e promovendo a oxidação – o oposto daquilo que nos últimos tempos é mais habitual fazer-se em enologia. Tendo acrescentado que hoje é comum os enólogos procurarem o ponto de maturação e fazerem depois o blend na adega – enquanto antigamente se usava antes a co-fermentação. Continuarão afinal válidas as práticas antigas que entretanto foram sendo consideradas ultrapassadas?
Passando para o segundo copo, da década de 60 foi provado um ano mítico – 1963. Novamente, um branco que não mostra a idade que tem. Em grande forma, apresenta um salitre muito característico e também um ligeiro amargor – será de ser vinificado com engaço? – que funciona muito bem à mesa e lhe dá imensa vida! Como comentou Paulo Nunes, «muitas vezes foge-se dos amargores e da adstringência… mas se calhar não é esse o caminho!»
Já o de 1974, com uma ótima acidez, levou a que a sala discutisse a importância das castas que podem dar um ‘tempero’ ao vinho – por exemplo, aqui no Dão do Centro de Estudos, a Uva Cão e a Terrantez são as que aportam ao lote uma maior acidez.
Avançando, como o branco dos anos 80 não estava disponível, a primeira parte da prova terminou com o 1995, um vinho completamente diferente dos três anteriores, com notas e sensações muito mais atuais, mais aromático – sentia-se inclusivamente o apetrolado típico dos melhores Riesling e dos Alvarinhos velhos.
De seguida, passou-se para os tintos.
E o primeiro foi o 1958. Novamente, um vinho com 60 anos! Extremamente complexo! Mas com imensa cor! Não estava acastanhado, como muitas vezes sucede com os vinhos mais antigos! E tinha tanta fruta! Passados 60 anos, continuava carregado de aromas primários! Tendo 12,7% de álcool, uma acidez de 7,1 g/l e um pH de 3,1. Quanto ao encepamento, foi obtido a partir de Touriga Nacional, Bastardo, Tinto Cão, Alfrocheiro, Alvarelhão, Trincadeira, Jaen e Rufete. Não houve desengace. E fermentou nos lagares sem qualquer controlo de temperatura, a 33 - 35 ºC…!
Para o tinto da década de 60, a escolha recaiu novamente no mítico ano de 1963. Mas desta vez – e foi o único caso nesta prova – Paulo Nunes optou por um monovarietal, para mostrar o que é (e como é) a verdadeira Touriga Nacional do Dão: viva, com imensa frescura, com enorme complexidade… e sem ser aborrecida! Muitas vezes encontramo-la muito exuberante aromaticamente, com grande concentração e até com uma cor azulada. Mas o Dão também consegue fazer vinhos só de Touriga Nacional elegantes e equilibrados! E que, mais de meio século depois, continuam em grandessíssima forma!
Com o 1974 regressámos a um vinho de lote – estava muito vivo, a sentirem-se os taninos!
O de 1983 continua muito jovem e ainda mantém a componente aromática.
E finalmente o de 1996, que não parece já ter uns inacreditáveis 22 anos!
Foi uma prova memorável.
Repleta de vinhos que desafiam a lógica do tempo.
E que desafiam também o modo como atualmente se faz e se pensa o vinho.
Conforme disse Paulo Nunes, «estes vinhos do Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão são um verdadeiro tratado de enologia!»
Vinhos produzidos nas décadas de 50 a 90 do século XX…
… no Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão…
… em Nelas…
… numa prova conduzida pelo enólogo Paulo Nunes
1 – BRANCOS
1958
1963
1974
1995
2 – TINTOS
1958
1963
1974
1983
1996
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