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A estreia do Carignan

por Raul Lufinha, em 25.02.20

Enólogo Ricardo Constantino e produtor Luís Serrano Mira na Sala do Tribunal do Palácio da Bolsa, no Porto, durante a prova comentada “Herdade das Servas: a estreia do Carignan e a consolidação das vinhas velhas”

Na Sala do Tribunal, do Palácio da Bolsa, no Porto...

Enólogo Ricardo Constantino e produtor Luís Serrano Mira na Sala do Tribunal do Palácio da Bolsa, no Porto, durante a prova comentada “Herdade das Servas: a estreia do Carignan e a consolidação das vinhas velhas”

... o enólogo Ricardo Constantino e o produtor Luís Serrano Mira...

Enólogo Ricardo Constantino e produtor Luís Serrano Mira na Sala do Tribunal do Palácio da Bolsa, no Porto, durante a prova comentada “Herdade das Servas: a estreia do Carignan e a consolidação das vinhas velhas”

... na prova comentada “Herdade das Servas: a estreia do Carignan e a consolidação das vinhas velhas”

Gerou uma enorme expectativa a prova comentada da Herdade das Servas na 17.ª edição da Essência do Vinho, que decorreu no Palácio da Bolsa, no Porto.

Estava agendada para a imponente Sala do Tribunal.

E o produtor alentejano – mais virado para o futuro do que para o passado – propunha-se fazer «a estreia nacional de um monocasta de Carignan»!

Carignan?

Sim.

«Uma casta autóctone da região Cariñena, em Espanha, e bastante presente no Alentejo de outrora – necessita de uma região com elevadas horas de insolação e solos pouco férteis para limitar a sua produção e aumentar a qualidade e longevidade dos vinhos que lhe estão na base –, mas nunca usada em estreme.

[E.T. – Serão muito poucas mas existem referências anteriores de monoscastas portugueses de Carignan. Tomás Caldeira Cabral recorda-se “de um Carignan da Casa Cadaval nos anos 70 ou 80”. E entretanto também encontrei a referência a um Carignan da Quinta do Côro de 2001. Curiosamente ambos produtores da então região do Ribatejo.]

Uma casta vigorosa, com maturação tardia, película grossa e mosto de elevada acidez natural, que dá origem a vinhos frescos e elegantes.

Com origem numa vinha com 45 anos de idade, a Herdade das Servas procura com este vinho mostrar o carácter e a frescura das uvas de uma vinha conduzida em vaso e de baixa produtividade.

Uma edição limitada a pouco mais de 3500 garrafas.»

Herdade das Servas Parcela C Carignan Single Vineyard tinto 2016

Herdade das Servas Parcela C Carignan Single Vineyard tinto 2016

Porém – para se perceber bem o verdadeiro nível do Carignan que ia ser apresentado – antes do novo vinho e de modo a enquadrá-lo devidamente, a Herdade das Servas resolveu fazer nada mais nada menos do que uma prova vertical do seu topo de gama!

Antes do novo vinho, os topos de gama???

Pois, uma manobra arriscadíssima!

Mas também um excelente sinal!

Se o Carignan não fosse mesmo bom, não aguentaria a comparação com os melhores vinhos de sempre da Herdade das Servas! Ou seja, a comparação com os emblemáticos Vinhas Velhas de 2005, 2009, 2012 e 2015 – isto é, todas as edições exceto o 2014. E depois, mais ainda, o embate com o estratosférico Parcela V de 2011.

Cinco vinhos que foram efetivamente memoráveis – qualquer um deles, daqueles com os quais poderíamos ficar a conversar todo um jantar. Confirmando a anunciada “consolidação das vinhas velhas”.

Até que chegou então o Carignan.

Com duas nunces, porém.

Uma, foi a de que não era apenas um, mas três Carignans – com efeito, apesar de estar a ser efetuada a apresentação e pré-lançamento da colheita de 2016, a Herdade das Servas, valorizando ainda mais esta sessão na Essência do Vinho, trouxe também para prova o 2017, atualmente em estágio, e, ainda, uma amostra de cuba já do 2019.

A outra nuance consistiu no facto de o enólogo Ricardo Constantino ter invertido a ordem cronológica seguida inicialmente, de modo a começar pelo Carignan mais recente.

E assim foi.

Primeiro, uma amostra de cuba da colheita de 2019. Um Carignan muito primário, ao ser provado tão perto da vindima. E com três notas marcantes: fruta, acidez e tanino.

A seguir, o 2017, ainda em estágio. Mais complexo e mais polido. Sobressaindo a acidez, a frescura.

E depois, por fim, o culminar de toda esta prova tão especial – o 2016.

Que estagiou 12 meses em barricas novas de carvalho francês.

E que depois repousou em garrafa na cave durante 20 meses.

«Vinho límpido, vermelho violeta, aromas de ameixa, amora, figo e tosta de barrica. Fresco, elegante e estruturado, com notas de especiarias provenientes do estágio em carvalho francês, taninos ricos e final longo revelando a elevada acidez natural.»

De facto, um vinho extremamente elegante e complexo, com duas características marcantes, que nem sempre temos a felicidade de encontrar em simultâneo:

A Fruta – fruta madura;

E a frescura – tinha uma ótima acidez.

Resultando isto do facto de ser feito com uvas provenientes de uma vinha já antiga, com mais de 40 anos – e que tinha sido plantada em 1974 pelo Pai de Carlos e Luís Serrano Mira, então paradoxalmente numa lógica de volume para as ex-colónias. Resulta ainda da forma como a vinha foi trabalhada ao longo do ano, claro, nomeadamente diminuindo a produtividade para aumentar a qualidade – aliás, esta vinha, a vinha da Cardeira Velha, só entrou para o universo da Herdade das Servas em 2015. E resulta também obviamente, este clássico binómio fruta madura / frescura, da própria casta.

Com efeito, a uva Carignan é uma autêntica reserva ácida, tem um extraordinário equilíbrio ácido.

O que se torna deveras importante numa região quente como o Alentejo – na verdade, ao contrário do que sucede com outras castas, com a Carignan não é necessário interromper o ciclo de maturação da uva e colhê-la mais cedo para garantir que não se vai perder a acidez.

Ou seja, é possível ter fruta madura sem sacrificar a acidez.

Conseguimos ter fruta madura e ter também acidez.

Mesmo madura, a Carignan tem naturalmente uma elevada acidez!

De modo que – percebe-se após a prova – este Carignan da Herdade das Servas é um vinho que segue a linhagem dos Vinhas Velhas.

E que irá certamente continuar a evoluir de modo muito favorável em garrafa – como, aliás, a comparação entre o 2019, o 2017 e o 2016 já deixa antever.

Fazendo, pois, todo o sentido ser apresentado como um prolongamento dos seus gastronómicos topos de gama!

Imperdível para qualquer enófilo, será lançado no final de março com um PVP de 40 €.

IMG_3148_2.jpg

Os 8 vinhos em prova: Herdade das Servas Vinhas Velhas tinto 2005, 2009, 2012, 2015; Herdade das Servas Parcela V tinto 2011; Herdade das Servas Parcela C Carignan Single Vineyard tinto 2019 (amostra de cuba), 2017 (em estágio), 2016 (pré-lançamento)

Porém, a estreia do Carignan não é apenas um marco histórico para a Herdade das Servas.

Também o é para o Alentejo!

Desde logo, claro, por ser o primeiro 100% Carignan alentejano de que há memória.

Mas também por uma outra razão que – apesar de não ter sido abordada na prova – importa referir.

E que é a seguinte:

Este Carignan é importante para nos continuar a mostrar que há outros caminhos no Alentejo!

Ainda para mais, nestes tempos de alterações climáticas em que a pedra-de-toque de todos os vinhos é a acidez.

Ora, atualmente a moda na região – e até cada vez mais fora dela – é fazer os topos de gama tintos com Alicante Bouschet.

O que, como vimos nesta prova, também sucede na Herdade das Servas – é a casta dominante nos Vinhas Velhas.

E o que, aliás, para não ir mais longe, acabou novamente de ser reconhecido já nesta mesma edição da Essência do Vinho. Com efeito, na prova “Top 10 Vinhos Portugueses”, promovida pela Revista de Vinhos, especialistas e líderes de opinião convidados, oriundos de uma dezena de países (Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, EUA, Inglaterra, Itália, Rússia, Suécia e Suíça) juntaram-se aos portugueses e provaram, em prova cega, na manhã de 20 de fevereiro, no Palácio da Bolsa, os pré-selecionados 46 vinhos que tinham obtido as melhores pontuações na publicação ao longo de 2019, nas categorias de brancos, rosés, tintos e fortificados (Portos, Madeiras e Moscatéis). Ora, não por acaso, dos quatro tintos do Top 10, os dois primeiros são alentejanos! O vencedor, o melhor tinto, foi o Grande Rocim Reserva 2015, produzido por Catarina Vieira e Pedro Ribeiro, na Herdade do Rocim – sem surpresa, um 100% Alicante Bouschet! E o segundo melhor tinto português foi o Altas Quintas Obsessão 2007, então de João Lourenço, um lote assinado por Paulo Laureano com o tempero da Trincadeira, mas em que mais uma vez a casta dominante (75%) é precisamente… a Alicante Bouschet!

Todavia, o que este Carignan nos diz – não sendo o único a fazê-lo, claro, mas indo indiscutivelmente contra a tendência atual – é que o Alentejo de topo não é só Alicante Bouschet!

O que este surpreendente vinho da Herdade das Servas nos mostra é que continuam a existir outros caminhos no Alentejo para os tintos de topo!

E que – essa é a grande novidade desta prova – mais um desses caminhos alternativos chama-se... Carignan!

 

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publicado às 20:35



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