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Há três modas que prejudicam a experiência gastronómica e que não era preciso terem chegado a 2020.
1. Comida queimada. Queimado é defeito. É ir para lá do ponto certo. Às vezes, por desleixo e falta de atenção. Mas também há casos – mais graves – em que é intencional, em que se estraga e desrespeita propositadamente o produto, alegadamente em busca de algo como, por exemplo, o amargor ou a crocância... Infelizmente, ainda há muitos casos por aí. Desde os pães com a côdea esturricada até às pizzas carbonizadas. Desde os grelhados que só sabem a carvão, sejam de carne, peixe ou legumes, até ao leite-creme literalmente queimado e aos pastéis de nata completamente calcinados. Porém, o queimado faz mal à saúde. E ao ambiente. E é de mau gosto: sabe mal. Sendo também um desperdício. Comida queimada, não.
2. Pratos para partilhar que são empratados como se não fossem para partilhar. Com a generalização dos empratamentos individuais caiu-se no cúmulo de também empratar da mesma forma (ou seja, individualmente) os pratos que não são individuais, os pratos que são para partilhar, os pratos que são colocados no centro da mesa para toda a gente se servir. Porém, nem todos os pratos funcionam bem no modelo de partilha. Especialmente aqueles que têm um molho ou um caldo. O exemplo mais óbvio é o bitoque com ovo a cavalo – colocado no centro da mesa, não resulta. De facto, parece ridículo alguém querer partilhá-lo por várias pessoas. Mas é muito comum encontrarmos, para partilha, pratos semelhantes, ou seja, pratos com molhos, pratos com caldos, pratos com sucos que se vão depositando no fundo – ora, esse tipo de pratos só funciona em partilha se já vierem divididos individualmente da cozinha, sob pena de não se poder desfrutar plenamente dessas criações dos chefes.
3. Mesas comunais. Juntar clientes desconhecidos à mesma mesa, geralmente muitos, pode ser uma experiência extremamente divertida e interessante. Porém, para quem dá prioridade à comida, esse lado convivial desfoca-nos do mais importante. Sendo também uma potencial fonte de desconforto, pois as pessoas não comem todas ao mesmo tempo – as mais rápidas acabam por ter que ficar à espera das mais lentas, sofrendo com a falta de fluidez da refeição; e as mais demoradas (nomeadamente, as que gostam que lhes seja explicado o que está a ser servido, as que gostam de fotografar os pratos, as que gostam de apreciar e discutir entre si as criações dos chefes) acabam por se sentir pressionadas (e muitas vezes são mesmo) para acompanharem a cadência dos restantes parceiros de mesa. E podem também não estar todas a beber o mesmo e ao mesmo tempo – é, aliás, comum o menu de vinhos não ser seguido por todas as pessoas, gerando entropias adicionais. Ou seja, a mesa comunal é um formato que, tendo embora as suas vantagens, acaba também por prejudicar a experiência gastronómica.
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